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Recall da Ford dá dores de cabeça a proprietários do EcoSport


Há cerca de um mês, a Ford convoca, por meio de carta, proprietários do EcoSport, modelos 2012 e 2013, equipados com motor 1.6 Sigma, para substituição do parafuso de fixação do compressor do ar-condicionado e fixação da mangueira inferior do radiador. Conforme o comunicado, pode haver uma interferência entre a mangueira e o parafuso, o que os mecânicos das revendas autorizadas traduzem: tal interferência pode resultar na perfuração da mangueira, com risco de vazamento do líquido do radiador e possibilidade de superaquecimento do motor. Mesmo considerando os vários danos que isso pode gerar no motor, incluindo o de o carro não poder mais rodar, a Ford não considera que o defeito comprometa a segurança e, por isso, não convocou um recall, mas um “programa de satisfação ao cliente”, que inclui os modelos 1.6 produzidos de 29 de junho de 2012 a 31 de julho de 2013.

 

O problema é que as concessionárias da marca também não receberam peças suficientes para sanar o problema. A empresária Juliana Santos Dumont Ferreira Antunes recebeu a carta da Ford antes do carnaval, ligou imediatamente para uma oficina autorizada na tentativa de agendar o serviço e qual não foi a surpresa quando lhe disseram que nem sabiam de tal programa. Cinco dias depois, retornaram a ligação confirmando a campanha, porém com a informação de que o nome dela entraria em uma lista de espera para a realização do serviço tão logo a Ford enviasse as peças. Até o fechamento desta edição, Juliana ainda era a quinta na lista, sem previsão de chegada das peças.

 

A reportagem ligou para várias concessionárias Ford da capital. Todas trabalham com lista de espera e não sabem dizer quando os componentes irão chegar. “Dependemos da Ford”, diz uma atendente.
Das revendas consultadas, a que tem menor lista tem 80 clientes à espera das peças; a de maior lista, cerca de 120. Em uma delas, a funcionária conta que chegaram 25 kits – que seriam compostos do parafuso e presilha do ar-condicionado e mangueira do radiador – no início da campanha, mas depois não receberam mais. Para outra, foram enviados apenas 15 até o momento.

 

Sobre a gravidade do problema e os possíveis danos – ao contrário das convocações de recall, a campanha não menciona o que o defeito pode provocar –, os consultores das oficinas autorizadas admitem que pode haver superaquecimento do motor caso a mangueira fure e o líquido vaze. “Mas isso não vai acontecer porque a peça vai chegar”, diz um deles, otimista. Mais cauteloso, outro mecânico alerta para o risco inclusive de o motor fundir. “Se o problema acontecer, a luz do superaquecimento vai acender no painel. Nesse caso, o recomendado é parar o carro, porque senão o motor pode fundir”, avisa.

 

Fizemos contato também com o Centro de Atendimento Ford pelo número mencionado na carta (0800 703 3673), que de nada adiantou.

“Não se trata de recall porque não é um problema que ocasione acidente”, explica a atendente. “Mas o meu atendimento não faz agendamento”, continua, dizendo que é preciso fazer contato com uma concessionária da marca. A atendente também não soube dizer se há peças nem tampouco descrever o defeito.

ANO PASSADO Enquanto a Ford chama para a campanha proprietários dos modelos 2012 e 2013, a também empresária Adriana Santos Dumont Ferreira, dona de um EcoSport FreeStyle 14/14, sentiu literalmente na pele o superaquecimento do motor em outubro do ano passado, quando o veículo tinha apenas 600 quilômetros rodados e cerca de um mês de uso. O problema parece ser exatamente o descrito pela Ford na atual campanha. “Estava andando quando a luz da temperatura acendeu. Liguei para o atendimento Ford e disseram que poderia ser mau contato. Quando liguei o carro novamente, a luz acendeu de novo. O ar estava ligado e eu estava com meus filhos.
Eles viram uma fumaça saindo do ar-condicionado. Era uma fumaça fria e não tinha cheiro de queimado. Não saía pelo capô, mas tive que abrir as janelas, pois era muita fumaça. Não tinha água no radiador, o reservatório estava vazio. Então o enchi, quando vi que a água estava pingando no chão. Liguei novamente para o atendimento Ford e pedi um reboque”, lembra.

 

O carro foi levado para a concessionária mais próxima e foi constatado um defeito de fabricação. “Não falaram exatamente o nome da peça que tinha que trocar, mas disseram que era uma peça que ligava a mangueira do ar ao radiador”, conta. Adriana relata que o defeito de fabricação foi assumido rapidamente e em momento algum foi questionado nenhum tipo de mau uso. A montadora assumiu o conserto em garantia (o veículo tinha apenas 600 quilômetros). O problema, novamente, foi a falta da peça para o conserto e essa é a principal causa da chateação de Adriana.

“A Ford me deu um carro reserva por apenas cinco dias, mas o meu demorou 29 dias para ficar pronto. Achei um descaso enorme”, desabafa.

 

DIREITOS Para o advogado Henrique Freire, especialista em direito do consumidor, a campanha de serviço deveria ser um recall, já que existe a possibilidade de danos ao motor e a parada repentina do carro, o que pode, sim, comprometer a segurança. Sobre a falta de peças, ele afirma que a existência da peça para substituição do componente defeituoso é obrigação do fornecedor, que tem um prazo de 30 dias para sanar o defeito (artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor/CDC). Especificamente sobre a situação de Adriana Ferreira, ele considera que ela tem direito a uma indenização correspondente ao aluguel de um veículo durante os 24 dias que ficou sem carro. A opinião de Henrique é corroborada pelo advogado Geraldo Magela Freire, que vai além: “Entendo que o recall tem que ser praticado sempre que há a ocorrência de um defeito em série e não somente quando há risco à saúde ou à segurança dos consumidores, em razão da produção e comercialização em massa e pela proteção ao consumidor conferida pelo CDC”. E acrescenta: “O fornecedor tem que atender com a maior brevidade o consumidor, que comprou um produto para sua satisfação pessoal e não tem que ser obrigado a esperar pelo tempo que o fornecedor desejar”.

 

FORD RESPONDE Segundo a Ford, “a ocorrência detectada é a interferência de um dos parafusos de fixação do compressor do ar-condicionado junto à mangueira inferior do radiador. Para evitar essa interferência, o parafuso de fixação desse compressor será substituído por outro com novo dimensional, assim como a presilha de fixação da mangueira. Além da substituição desses componentes, o distribuidor deverá inspecionar a mangueira para identificar possíveis danos, ainda que em estágio inicial. Caso constatada qualquer avaria, a mangueira também será substituída”. A marca reafirma a posição de que o defeito não afeta a segurança e, por isso, a campanha é um programa de satisfação ao cliente”.

Sobre as peças, a Ford diz que há estoque suficiente, mas acrescenta que cada caso será analisado.

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