UAI

Rodamos no Fiat 147 ano 1979, o primeiro carro a álcool fabricado em série no mundo

Conheça a história da primeira unidade a etanol a sair da fábrica de Betim, assim como o futuro do combustível derivado da cana-de-açúcar

Publicidade
SIGA NO google-news-logo
Rodamos no Fiat 147 ano 1979, o primeiro carro a álcool fabricado em série no mundo
Leilão acontecerá no dia 17 de novembro Fotos: RM Sotheby’s/Divulgação


A Fiat resgatou para seu acervo de veículos históricos a primeira unidade do modelo 147 a sair de fábrica equipada com motor a álcool (etanol). Na verdade, o veículo representa um pouco mais que isso, o pequenino é, até que se prove o contrário, o primeiro veículo a etanol fabricado em série no mundo. O veículo pertencia ao Ministério da Fazenda, em Brasília, onde estava desde o dia 5 de julho de 1979. O próprio fabricante não sabia do paradeiro do compacto, que retornou ao lar graças à iniciativa de funcionários do Ministério, que reconheceram sua importância histórica e entraram em contato com a marca italiana.


Provavelmente o que salvou o veículo – com chassi número 147A0224805 e placa FO-0292 (de Brasília) – foi uma plaquinha metálica afixada sobre o painel imitando madeira com poucas palavras gravadas que situam sua condição histórica. A insígnia ainda traz a informação de que o veículo é inalienável e que “por ocasião de sua baixa de serviço deverá ser recolhido ao Museu da Fazenda Federal”. Fato é que o veículo está sob os cuidados da Fiat, que o deu um trato – não uma restauração – para que ficasse bonitinho e voltasse a rodar.


Por sorte, o carrinho pintado de preto e com uma faixa central branca ficou bem guardado ao longo desses 40 anos, contribuindo para sua boa conservação o clima seco de Brasília e o abrigo do tempo. Os 80 mil quilômetros registrados no hodômetro mostram que, ou o carro rodou muito pouco, ou rodou o bastante para zerar o “reloginho” e andar por mais 80 mil quilômetros. Porém, levando-se em conta o estado do veículo, apostamos um Chicabon na primeira opção.


De acordo com Ricardo Dilser, assessor técnico da Fiat e um dos responsáveis por trazer o veículo novamente à luz, a pintura recebeu apenas um polimento, o que torna notável (e quase inacreditável) o estado das lentes dos faróis e lanternas, e o alinhamento da carroceria. Ressecados, os quatro pneus foram trocados. A manutenção mecânica abrangeu troca de velas, óleo, filtros de combustível, óleo e ar, fluido de freio, tanque de combustível, corretor de frenagem, além da limpeza do carburador.


Rodamos com o carrinho na pista de testes da Fiat, em Betim, onde, há 40 anos, o veículo desfilou para poder ganhar as ruas. Como foi dito, o veículo não ganhou uma restauração completa. Mesmo rodando na pista há algum tempo, o motor demorou a ligar, fazendo vir à mente a lembrança daquelas manhãs frias da década de 1980 e o trabalho que dava para dar a partida em carros a álcool. Basta ficar parado perto do veículo (com o motor ligado, é claro) para saber porque o apelido do carrinho para a equipe de desenvolvimento virou “Cachacinha”, como sugere o cheirinho do escapamento.


Outra versão da alcunha garante que, com pouquíssimos postos de abastecimento vendendo etanol, a falta de combustível chegou a ser suprida com o aguardente de cana. O câmbio faz jus à fama, com engates “custosos”. De qualquer forma, é impossível não se divertir a bordo do carrinho, que, apesar de bastante compacto e pesar apenas 800kg, acolhe (sem conforto) quatro adultos. Segurança não havia, a começar pelos cintos de segurança dianteiros diagonais, faltando o apoio subabdominal.


CONTEXTO Para quem não era nascido, o carro a álcool foi uma demanda estimulada pelo programa Pró-Álcool (Programa Nacional do Álcool), criado por decreto em 1975, em resposta ao aumento do preço do petróleo no mercado internacional. Em 1985, nada menos que 95,8% dos automóveis fabricados no Brasil eram a etanol. Pouco depois disso, entre outros fatores, um novo ciclo de baixas no preço do petróleo fez com que o uso do etanol não valesse mais a pena.

Junte a isso a elevação do preço do açúcar, que chegou a provocar a escassez do etanol nos postos de combustível, e o programa foi para o espaço, fazendo com que vários proprietários desses veículos jurassem que nunca mais comprariam um carro a álcool. A salvação da lavoura foi o “advento” do carro flex, em 2003, que permitiu ao motorista optar pelo combustível que lhe convém, álcool ou gasolina. Se por um lado a tecnologia flex deu certo, por outra o etanol peca por apresentar consumo em média 30% superior a gasolina.



FUTURO
Porém, de acordo com João Irineu, diretor de assuntos regulatórios e compliance da FCA, devido à crescente demanda por reduzir emissões, o etanol ainda tem um importante papel a cumprir no mercado automotivo brasileiro, a começar pelo fato de ter uma plataforma produtiva, logística e de distribuição já consolidada. Outro fator importante é o ciclo de desenvolvimento da cana-de-açúcar, que absorve de 70 a 80% do CO2 liberado no ciclo “do poço à roda”, que leva em consideração não só o CO2 emitido pelo motor a etanol, mas também o dos outros veículos a diesel ou gasolina envolvidos em todo o ciclo do combustível, levando em consideração, por exemplo, as emissões dos tratores durante o cultivo ou o dos caminhões durante o transporte.

Para os veículos mais baratos, o etanol também se torna uma solução interessante em relação aos veículos elétricos. “O custo das baterias para veículos elétricos está na ordem de US$ 6 mil, o que pode ser diluído em veículos de maior valor agregado, mas não em populares. Os elétricos podem ficar bem no portfólio de um fabricante, mas pouco ajudam a cumprir as metas de emissões, já que esse número leva em conta a média da frota de cada montadora. Então, o que são mil carros elétricos para um fabricante que produz 500 mil veículos por ano?”, explica.

Para Irineu, o caminho do etanol no Brasil ainda é longo, devendo passar por uma melhoria da qualidade do próprio combustível (como a redução da quantidade de água e o etanol de segunda geração). A Fiat garante que está desenvolvendo para o médio prazo um motor a etanol de alta eficiência, com tecnologias como turbo, injeção direta e melhorias termodinâmicas. Porém, quando questionado se alguém compraria um carro com motor exclusivamente a etanol, Irineu relativiza que o mercado não receberia bem esse produto, e que o motor teria que não só ser flex, quanto apresentar melhor eficiência com ambos os combustíveis (só faltou falar como). Por fim, o motor a etanol entraria na era do híbrido elétrico (olha, a Toyota já está chegando aqui com o Corolla híbrido flex!), para depois chegar à célula de combustível.



FICHA TÉCNICA  -
FIAT 147 1.3 ETANOL



CARROCERIA E CHASSI
Carroceria de chapa de aço estampado, tipo sedã, três portas e cinco lugares, estrutura monobloco diferenciada.

MOTOR
Dianteiro transversal, quatro cilindros verticais em linha, bloco em ferro fundido, árvore de comando de válvulas no cabeçote acionada por correia dentada, alimentação por carburador monocorpo de fluxo descendente, refrigeração a água com ventilador elétrico. Diâmetro e curso dos pistões: 71,5 x 76 mm; cilindrada total: 1.297,5 cm3; taxa de compressão: 11,2:1; potência: 70 CV/51,5 kW (SAE) a 5.600 rpm; torque: 11,5 mkgf/111,6 Nm (SAE) a 3.000 rpm; etanol.

TRANSMISSÃO
Tração dianteira, embreagem monodisco a seco de acionamento mecânico, caixa de câmbio mecânica de quatro marchas sincronizadas à frente e uma à ré, com alavanca de mudanças no assoalho. Relações de câmbio: 1ª) 4,091; 2ª) 2,235; 3ª) 1,454; 4ª) 0,959; ré) 3,714; relação do diferencial: 4,077.

SUPENSÕES
Dianteira – Independente, com braços oscilantes e montantes fixados a amortecedores telescópicos hidráulicos, molas helicoidais e barra estabilizadora.
Traseira – Independente, com braços oscilantes inferiores e amortecedores telescópicos hidráulicos, feixe de molas transversal tipo semi-elíptico de três lâminas, que funciona também como estabilizador.

FREIOS

Freio de serviço de acionamento hidráulicos, circuitos independentes, discos na frente e tambores autocentrantes atrás, com regulador de frenagem agindo sobre o circuito traseiro conforme a carga do veículo.

DIREÇÃO

Mecânica, de pinhão e cremalheira, com 3,4 voltas de batente a batente; diâmetro de giro mínimo de 9,1 metros.

RODAS E PNEUS
Rodas de aço estampado, com aro de 13 polegadas e tala de 4 polegadas. Pneus radiais 145-80SR-13.

SISTEMA ELÉTRICO
Bateria de 12V e 36 Amp/h; alternador de 35 Amp.

DIMENSÕES
Distância entre-eixos: 2.225 mm; bitola dianteira: 1.270 mm; bitola traseira: 1.289 mm; comprimento: 3.627 mm; largura: 1.545 mm; altura: 1.350 mm; distância máxima do solo: 140 mm.

CAPACIDADES
Tanque de combustível: 38 litros; porta-malas: 365 litros.

PESOS
Peso líquido em ordem de marcha: 790 quilos.