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Gurgel - Aproveitando o vacilo

Empresário do interior paulista registra a marca fundada por engenheiro no fim da década de 60 e, ignora a polêmica em torno do assunto, anunciando investimentos

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Leilão acontecerá no dia 17 de novembro Fotos: RM Sotheby’s/Divulgação

Triciclo TA-01 homologado pelo Detran tem motor e transmissão feitos na China.

Este ano, a indústria automobilística brasileira completa cinco décadas de existência e, nesse período, muitos fatos contribuíram para a evolução do setor. Um dos personagens dessa história é João Augusto do Amaral Gurgel, que, no fim da década de 1960, fundou sua própria montadora no interior paulista, produzindo veículos populares e 100% nacionais. Com mecânica Volkswagen e carrocerias de fibra-de-vidro, os jipes e utilitários da Gurgel marcaram presença no mercado brasileiro, mas as dívidas levaram a empresa à falência em 1994.

A massa falida passou a ser administrada por um escritório de advocacia e Gurgel foi acometido por uma grave doença, que o deixou em condições precárias. Em 2004, surgiu no cenário o empresário Paulo Emílio Freire Lemos, de Presidente Prudente, interior paulista, que comercializava rodos importados da China. Em viagem àquele país, ele ficou empolgado com a possibilidade de importar para o mercado brasileiro pequenos veículos comerciais de três rodas, para fins agrícolas.

Enquanto cuidava dos trâmites legais para a importação do produto, Paulo Emílio acabou descobrindo que a marca Gurgel estava desprotegida, ou seja, constava como extinta no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). Ele não teve dúvida e registrou a marca em seu nome sem fazer qualquer consulta à família Gurgel ou ao administrador da massa falida. Além disso, Paulo Emílio arrematou em um leilão da massa falida, em 2005, o ferramental e seis modelos que faziam parte do acervo da Gurgel.

Família

Para Cristina Gurgel, filha de João Augusto do Amaral Gurgel, faltou ética por parte de Paulo Emílio, ao registrar a marca que não lhe pertencia e que faz parte da história de seu pai. Ela afirma que a família não teve como impedir a atitude do empresário e que o único que poderia fazê-lo seria o gestor da massa falida. "A marca deveria ter sido vendida para pagar ex-funcionários da empresa, que podem cobrar direitos trabalhistas", revela.


Cristina conta que chegou a conversar com Paulo Emílio e que, na ocasião, ele teria dito se orgulhar por ter dado "um golpe de mestre". "Ele realmente deu um golpe, mas não foi de mestre", afirma. Mas ela não acredita que o empresário paulista conseguirá relançar os modelos Gurgel, já que não tem os projetos e desenhos das peças. "O maior orgulho de meu pai sempre foi a honestidade com a qual tratou seus negócios. Agora, essa história já começou mal e não tem como dar certo", desabafa.

Obra do destino

O empresário Paulo Emílio disse que não vê problemas em ter registrado a marca Gurgel sem ter consultado a família ou o administrador da massa falida. "A família foi incompetente na gestão da marca durante o processo de falência e acabou pagando por isso", afirma. Ele acrescenta que qualquer pessoa poderia ter registrado a marca, que estava extinta desde 2003, e diz que foi obra do destino as coisas terem acontecido dessa forma.

Ele revela que ao pesquisar sobre a história da Gurgel ficou apaixonado pelo trabalho desenvolvido por João Amaral. E, ao ser perguntado o que acha que o engenheiro Gurgel diria de sua atitude, disse: "Tenho certeza de que ele aprovaria. A Gurgel vai recomeçar de onde parou e pretendo levá-la muito mais longe. Além do mais, estou amparado pela lei, já que a compra da marca e do acervo da empresa obedeceu a todos os critérios legais".

Paulo Emílio confirmou a construção da fábrica da Gurgel em um terreno em Três Lagoas. As obras de fundação devem começar em breve e, até 2008, ele espera ter uma área construída de 12.000m², para uma produção inicial de mil veículos por mês, incluindo os triciclos agrícolas. Ele confirma que o X12 será relançado em 2007, com o motor VW 1.4 refrigerado a água, o mesmo que equipa a Kombi. Mas o empresário revela ter feito parcerias também com a Fiat e Tritec para o fornecimento de motores.

"No passado, Gurgel quis enfrentar as grandes montadoras, o que foi seu erro. Quero ser parceiro delas e, para isso, pretendo atuar em nichos não explorados pelas mesmas&", afirma. Ele garante que já tem 200 pedidos para o X12 e conta que os outros modelos Gurgel serão produzidos com base nos seis carros da marca arrematados no leilão da massa falida. Em 2009, quando a marca Gurgel completar 40 anos, Paulo Emílio pretende inaugurar um museu dentro da fábrica. "Gostaria de colocar o nome do João Augusto do Amaral Gurgel, mas não sei se a família vai autorizar. De qualquer forma, o museu da Gurgel será montado", afirma.

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